Damião Ramos Cavalcanti

Enquanto poeta morrer, a poesia haverá de viver

Textos


             Desbotam e enterram Areia Vermelha

          Brasileiro, no campo ou na igreja, até sem apetite, com nariz entupido, gosta de comer... O francês Jacques abriu refinado restaurante em Tambaú. Após certo tempo, fechou as portas, protestando contra  a  indiferença dos clientes às suas caprichadas receitas: "Brasileiro só gosta de tira-gosto"... Afora esta generalização, no litoral, existe sempre alguém mastigando algum pitéu.  Por isso, o confrade da Academia de Cinema, Wills Leal normatizou que ninguém pode entrar com comida nas sessões do Cine Clube "O Homem de Areia", diferenciando esses cinéfilos dos da  plateia dos cinemas aonde  vão mais para comer iguarias com refrigerante do que para assistir ao filme. Dias atrás, ao ver "Chico, o artista brasileiro", um casal  me desconcentrava ao ruminar um balde de pipocas, bebendo um litro de açucarado refrigerante. Esvaziado o balde, perderam quinze minutos  da sessão para comprar outro balde e mais um litro de refrigerante. Incomodado também pelos arrotos, mudei de lugar...     
          Não é por menos que, em Areia Vermelha, afogaram  as determinações de proteção ao pequeno trecho de terra no mar; agora, autoriza-se, "juridicamente", levar comidas em isopor,  sacolas ou marmitas; e, por lá, instalarem-se vendedores de bebidas, de espetinhos, de churrasco, em churrasqueiras, com sacos de carvão, fogões e botijões, e também em bar ou em barracas com mesas, cadeiras e tudo.  O francês tinha razão: Nada de admirar a natureza, o mar, ou caminhar ao lado de peixes coloridos; prefere-se a isso vê-los fritos, iguais a salsichas e a pedaços de carne como acompanhamentos da carraspana.
          Fernando de Noronha, ilha de maior grandeza, permanece sem alterações, cercada de águas por todos os lados; já a frágil  Areia Vermelha, conforme a maré, ora aparece, ora submerge. E enquanto não se esconde, talvez em definitivo, tudo aguenta... Em Fernando de Noronha, controla-se  a descida de  visitantes do navio à ilha, como preservação ao meio ambiente. Sem esses cuidados, a frágil Areia Vermelha é abandonada a naves, a barcos e a zepelins, a qualquer população que queira ali produzir lixo e restos da comida e do comido. A poluição sonora incomoda os  apreciadores da beleza do mar. A gulodice reivindica: Sem tira-gosto, Areia Vermelha não vale a pena... 
Damião Ramos Cavalcanti
Enviado por Damião Ramos Cavalcanti em 15/01/2016
Alterado em 17/01/2016


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