Fui presenteado pela autora com o livro “O Amor do Reverendo”. O prefaciador, Padre Waldemir Santana, elogia integralmente a obra de Irene Dias e afirma que ela “produz uma realidade possível”, do que discordo. Trata-se de realidade mais que possível, acontecida, acontecendo e que acontecerá, enquanto houver celibato obrigatório aos que optarem pelo ministério sacerdotal. Duas opções devem ser separadas: a do sacerdócio e a do celibato. Esta última é opcional a qualquer cidadão, por foro íntimo ou por dedicação exclusiva à vida religiosa. Daí se conclui “a possível” coexistência de padres casados e não casados no exercício do ministério e magistério da Igreja. Um dia assim será...
O romance se desenrola com duas principais personagens: o Padre Abraão e a jovem Maria Luísa que, voltando para casa, ao desmaiar na saída do Colégio das Neves, é vista caída ao solo, sendo socorrida pelo citado reverendo. Assim, nasce o romance entre os dois, o que, na época, ainda era tomado como escândalo. E, por aí, segue o enredo. Há outros livros sobre o assunto. Destaco os da paixão e perseverante amor entre Abelardo e Heloísa, no século XII. O jovem filósofo celibatário se dedicava à origem da Sorbonne, na “Île de la Cité”, em Paris, como já sucedia em Bologna e em Salamanca, depois imitadas por toda Europa.
Uma noite, o tio de Heloísa, Fulberto, descobriu o amor escondido entre ela e Abelardo; castrou o jovem professor e internou a sobrinha, como freira, num convento distante de Paris. Contudo, separados, vendo-se apenas poucas vezes como religiosos de votos e juramentos, nunca deixaram de se amar até o dia da morte. Nutriam um amor sublimado, sem contatos físicos, o que bem analisa o psicanalista e filósofo Zeferino Rocha, no seu livro “Paixão, violência e solidão – O drama de Abelardo e Heloísa, no contexto cultural do século XII”. O romance entre Abelardo e Heloísa, num cenário medieval, pode ser visto no filme “Em nome de Deus” de Clive Donner. Posto que tais fatos impõem a compreensão dessas relações sociais e suas transformações, obras semelhantes são valiosas enquanto relatos do nosso “possível” histórico-social.