Damião Ramos Cavalcanti

Enquanto poeta morrer, a poesia haverá de viver

Textos


                                           
                                               “É a mãe...”
    
    Mãe que brigue pela filha ou pelo filho tem sido normal, sendo muito mais mãe tigresa do que “mãe coruja”. Mas, também há filhos que brigam pela mãe. A molecada sabia fazer de tudo: quebrar vidraça, insultar vizinho, tirar goiaba do quintal alheio, fugir escondido para jogar “pelada” na rua, assanhar casa de maribondo, gazear aula, tomar banho no rio cheio, gritar apelidos injuriosos e, também sob a influência de um Roy Rogers, Bill Kid ou Rock Lane, entrar em briga de rua, briga esta geralmente para respeitar a mãe e defender esse respeito, distinguindo, sem molecagem, este peculiar respeito dos aperreios em casa e dos eventuais desrespeitos à autoridade materna. Na rua, para brigar, obedecia-se a um ritual. O provocador, com ares de magistrado, chamava as partes, passava dois riscos no chão e advertia: “Este aqui é sua mãe, e esse ali é a dele”. Cuspir ou apagar um daqueles riscos era o pontapé inicial de prolongada troca de socos e socavancos. Ser moleque é uma coisa; outra é deixar zombar da mãe sem alguma reação. E, quando assim um moleque desrespeita a mãe do outro, ele se mostra consciente de ofender o valor mais sagrado do seu rival desafeto. 
    Mãe não é aquela que apenas gera um filho. É, sobretudo, aquela que gera por amor, querendo o filho, antes de possuir ou de ser possuída sexualmente. Divide com a filha ou com o filho a respiração, confunde-o com o ventre, enquanto o protege e faz crescer, dando-lhe alimento da sua própria carne, do seu próprio sangue. E, se assim faz, continuará, durante toda a vida, amando aquele para quem se fez fecunda. Instintivamente, mãe é, na bela expressão da natureza, felina poderosa. Carrega o filhote com os dentes, enquanto luta, com todas as garras, contra qualquer perigo à sua indefesa cria. Tem sido rotina ler nos jornais sobre criança abandonada, às vezes morta, num depósito de lixo, renegando este instinto natural.Não, isto não é coisa de mãe! Ela apenas o pariu, equívoco chamá-la de mãe. Maternidade exige, se for o caso, que deixe o filho, mesmo de coração partido, confortavelmente num cesto, barco seguro com destino certo para ser salvo das águas, de iminente perigo, evitando que seja morto pelo faraó ou por injustiças sociais. 
    A lógica demonstra a ligação absoluta da mãe com o filho, como também do filho com a mãe: só existe mãe se existir filho, e só existe filho se existir mãe. Racional bicondicionalidade: ela é minha mãe se, e somente se, eu for seu filho. Do que se deduz por comutação: eu sou seu filho se, e somente se, ela for minha mãe. A mãe é aquela que incorpora em si mesma o idealismo do corpo e da alma do seu querido filho. Como a causa se prolonga no efeito, a mãe se prolonga na filha ou no filho. Porém, educando os filhos, em todos os sentidos, para que, como outras pessoas, eles cumpram seu destino, como se fossem flechas atiradas pelo seu arco ao infinito.
Damião Ramos Cavalcanti
Enviado por Damião Ramos Cavalcanti em 05/05/2011
Alterado em 05/05/2011


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