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O Rodízio
Como o filme “La Grande Bouffe”, de Marco Ferreri, do mesmo tema tratam livros e películas sobre costumes gastronômicos da antiga Roma, quando a nobreza se fartava, em longos e promíscuos banquetes, até não caber mais uma uva no estômago. Ato contínuo, enfiava o dedo indicador na garganta para provocar o vômito, rejeitando tudo aquilo que gulosamente tinha comido para conseguir repetir as gulodices. Entre esses comensais, imperava a gula, mas nenhuma pretensão a ganhos financeiros, aproveitando-se dos convites, como aqui, nas recepções e festas de casamento, quando, já satisfeitos, depois de se saciarem de bebida e comida, os convivas, elegantemente vestidos, enchem as bolsas e bolsos de guloseimas, levando-as para a sobremesa do dia seguinte.
Outra maior forma de economia tem se visto nos restaurantes que atraem clientes com as “vantagens” do rodízio. O que é esse rodízio? Haste de madeira cônica movida pela água ou rodinha nos pés do móvel? Alternância de pessoas nas funções do governo, de atletas numa corrida ou rotatividade de clientes em motéis? Conluio de sócio, conchavo de governante, cambalacho político? Não! Mas, tudo isso o termo pode significar, desde que não escrito num cardápio de certas churrascarias ou pizzarias que oferecem a especialidade da casa à vontade do freguês até ele não poder mais ingerir uma azeitona. Nessas ocasiões, a carne que o alimentaria apenas com o peso de cem gramas é comida acima de seiscentos gramas. Enfim, como se fosse, de uma só vez, seis ou, com bebidas e acompanhantes, sete ou oito refeições. Há até quem se prive das refeições domésticas, esvaziando o estômago, como os romanos, para o aproveitamento total do rodízio.
Bom gosto pela comida? Não! Em geral, os restaurantes que oferecem rodízio são de medíocre qualidade, com poucos clientes, preenchendo-se com pessoas que desejam comer muito, sem susto e carestia na hora da conta. Esse espetáculo lembra Biu Fubá, em Pilar, que engolia pacotes de fubá com água morna, recebendo por cada um cinquenta centavos de agrado. Também quem se submete a esse tipo de chantagem não se mostra apreciador da boa culinária, trocando a qualidade pela quantidade. Tanto é assim que, em países de requintada cozinha, onde o povo se educou a comer bem, não há o dito rodízio. Nem tampouco, terão, como aqui, jornais noticiando alarmantes estatísticas de mortes por obesidade. O viciado em rodízio jamais deixa o último pedaço de pizza ou, se na churrascaria, os derradeiros corações de galinha, comendo inúmeras vezes “a saideira”. Seguindo o cálculo de que o estômago sempre é menor do que a gula e a ganância dos seus clientes, prosperam os rodízios, até quando existir gente que vive para comer e “ter vantagem” e não come para se nutrir e viver.
Damião Ramos Cavalcanti
Enviado por Damião Ramos Cavalcanti em 14/10/2011
Alterado em 14/10/2011
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