Vacina só contra gripe
Fui, por insistência da mulher, ser vacinado contra gripe no Posto de Saúde de Tambaú. Todos os que estavam lá tinham certa idade, não havendo necessidade de fila preferencial, tampouco para idosos. Mas foi junto de um casal falante que arrumei um pequeno espaço no banco de espera. De repente, chegou uma sorridente enfermeira que se dirigiu à esposa do dito casal: “ - A senhora é de Patos!” A possível patoense, com ar de irritada, colocando as mãos sobre o busto, interpelou: “- Eu? Imagina! Eu tenho dois filhos cariocas!” O marido, tentando atenuar a rispidez da mulher, explicou ser ela não de Patos, mas de Pombal.
Olhando de soslaio, como desaprovasse a satisfação dada à enfermeira pelo esposo, a mulher voltou a discorrer sobre sua vida no Rio de Janeiro; a falar das inúmeras viagens do marido à Europa, aos Emirados Árabes, até á China, enfim, rodando o mundo como comandante de navio, “de navio de carga, da Petrobrás” ressalvou. E que, mesmo assim, não trazia presentes para ela e seus filhos “cariocas”, porque isso se achava facilmente no Rio; também dando a entender que nada disso aconteceria se ela fosse de Pombal. Então, uma senhora do banco vizinho, insinuando refazer a conveniência, arriscou pela última vez: “- Mas, Pombal é uma cidade bonita, de gente boa!” A “carioca”, não desagradando o marido de tudo, continuou: “- Só sei que há tempo lá não piso. Penso que até o túmulo dos parentes não existe mais. Nada é como o Rio, onde cemitério dá gosto ver. Meu marido anda esquecido, nasci em Campina Grande, mas vivo no Rio há muitos anos”. O marido, desconfiado, já cansado do assunto, querendo dar um final feliz à conversa, bateu o martelo: “- Somos daqui e aqui vamos ficar”. De pronto, sua companheira retificou: “- Você! Eu, hein!? Não me acostumo à cidade pequena, voltarei ao Rio, onde moram meus filhos.”
A essa altura, chovia. A enfermeira já tinha voltado ao trabalho, a fila prosseguia, e éramos poucos esperando a vacina e ainda escutando a longa discrição de como são os cariocas: “educados, pacatos, descontraídos e orgulhosos de sua cidade; lá só o carnaval vale a pena”. Assim, fomos vacinados contra eventual influenza, mas não contra esse tipo de coisas que, mesmo jocosas, nos constrangem como coriza da vaidade humana.
Enviado por Damião Ramos Cavalcanti em 01/06/2012
Alterado em 01/06/2012