Montar nas casas e nas pessoas
O reitor padre Luís Fernandes, que depois se tornou Dom Luis Fernandes, bispo de Campina Grande, era mais do que exigente em relação à formação dada pelo Seminário Arquidiocesano da Paraíba aos seus alunos; não exigia devoção de ninguém, mas seminarista do seu tempo deveria ser estudioso, instruído e consequentemente dominar bem a lingua mater, o latim e principalmente o idioma nacional. Estimulava circular, naquele internato, pequenos jornais que ocasionavam espaço para escrevermos; e funcionar “Grêmio” para treinarmos a arte de falar de improviso ou a própria oratória. Ele era exemplo de completa formação cultural, erudito, destacava-se o padre Luís como um exímio conhecedor da Filosofia que ensinava na FAFI da UFPB, ao lado do velho Lyceu, onde liderava intelectuais que o visitavam com frequência.
Estava eu justamente na portaria do Seminário para sair à rua, quando o reitor Padre Luís olhou seu relógio, assim insinuava que aquela hora era de estudo. Como não bastasse para eu voltar à banca de estudo, indagou: “ - Aonde vai?” Mesmo nervoso, respondi-lhe: - Vou no dentista. Então, ele perguntou: “ - O dentista já chegou?” Refeito do nervosismo, repeti o português mal falado: - Não! Sou eu que vou no dentista. Então, o reitor esclareceu: “- Pois, é. “Ir no dentista” é ir montado nele a algum lugar... Talvez desejasse dizer que vai ao dentista.” Desde aquele dia, nunca esqueci que o verbo “ir” é transitivo circunstancial. E passei a me esmerar nas conversas mais informais: Vou à praia, ao médico e depois ao cinema. Não indo a pé, irei na minha bicicleta. “Ir no médico” não é menos errado do que “ir no hospital” , talvez melhor ir no ônibus ou no navio do que montado num hospital.
Hoje, é corrente escutar tal expressão das autoridades, dirigentes, radialistas, âncoras de TV e sobretudo nas novelas, cujo erro se propaga e desfaz tudo aquilo que se ensina nas escolas. Ora, recursos públicos são gastos para ensinar crianças e jovens falarem bem o idioma nacional, deveria ser censurado o investimento contrário, pelo qual o poder e a mídia ensinam a falar o idioma rude e abrupto. Nobert Wiener, na sua obra “Cibernética e Sociedade”, soltou essa pérola: “A linguagem é um jogo conjunto, de quem fala e de quem ouve, contra as forças da confusão”, ao que acrescentaria: e do equívoco...
Enviado por Damião Ramos Cavalcanti em 08/02/2013
Alterado em 08/02/2013