Damião Ramos Cavalcanti

Enquanto poeta morrer, a poesia haverá de viver

Textos


Os Demolidores do Capitólio

          Contou-nos, no Seminário, o professor e historiador Eduardo Hoornaert que, em 390 a.C., quando os gauleses, considerados bárbaros pelo romanos, “silenciosamente às caladas da noite”,  invadiram Roma, somente o Capitólio reagiu porque os gansos, consagrados a Juno, protetor do Capitólio, grasnaram, acordando os soldados romanos que, em cima daquele monte, rechaçaram, de ladeira abaixo, os invasores. Até hoje se preservam o Capitólio e suas edificações, bem perto do Fórum Romano, como memória e história da Antiga Roma, por onde passaram césares, “os assassinos de Cesar”, “sabinas”, vestais dos templos, e, sob encomenda do Papa Paulo III, Michelangelo que arquitetou os mármores e a forma da Praça do Campidoglio, hoje, tão visitada em Roma.

          Porém, contra a invasão do Capitólio de Campina Grande os gansos grasnam e pouca gente escuta seus vigilantes alertas. Dias atrás, li, na imprensa local, que um “fiscal da defesa civil” sugeriu a demolição do Capitólio, com a justificativa de que suas paredes poderiam cair sobre os transeuntes. Essa conversa é manjada e repetida por aqueles que saboreiam a sanha imobiliária ou a venda de custosos projetos, quando se referem ao Patrimônio. Se fosse o caso, por que não sugerem escora, como receitam a edifícios ainda de fresca argamassa?  Para esses o Patrimônio pouco vale. Quando estive a frente do IPHAEP, visitei muitas vezes o Capitólio em companhia de competentes técnicos, arquitetos e engenheiros calculistas, para desfazermos tais diatribes e a opinião de quem pretendia ampliar, no lugar do Capitólio, a Praça Clementino Procópio. O parecer: “as robustas paredes do Capitólio estão firmes”. Então, ouvindo o mundo cultural, sugerimos à Prefeitura construir, aproveitando suas paredes externas, um Centro Cultural e de lazer, onde haveria biblioteca, videoteca, audioteca, sala cinematográfica, bar e, sobretudo, uma boa livraria de que carece a cidade.


          O Cine Capitólio faz parte da fisionomia do Centro Histórico de Campina Grande; indica às nossas lembranças a saída do Centro em direção a Recife, Itabaiana, Ingá ou João Pessoa. Constitui-se logradouro privilegiado para várias gerações de Campina rememorarem cineclubes e cinéfilos; foi ponto de paquera; poltrona do primeiro beijo; início de efêmeros namoros chamados de “flirt” ou de amores dos quais resultaram tradicionais famílias da terra. Cada campinense, se é da gema, sempre reviverá no Capitólio uma significativa circunstância da sua vida. Por que apagar essa história? Por que demoli-lo? Recuso-me perguntar aos “demolidores do Capitólio”... 


Damião Ramos Cavalcanti
Enviado por Damião Ramos Cavalcanti em 26/04/2013
Alterado em 26/04/2013


Comentários
H
Hugo Peregrino
Muito boa sua crônica, prof. Damião. Mesmo não sendo de Campina Grande, lá morei com meus pais na década de 1950 e o Capitólio já era marco referencial da vida cultural e social daquela cidade. Não à demolição do Capitólio bem que poderia ser uma reivindicação ao IPHAEP, com as devidas recomendações do urgente escoramento de suas paredes, sem que esquecer de que a Prefeitura elabore, também urgentemente, projeto de revitalização daquela edificação, acatando suas sugestões. Parabéns mais uma vez.
a
astenio fernandes
Aplauso campinense, Damião. Sua voz acode o Capitólio, Monumento solitário. Presa fácil ao vil iconoclasmo. Silenciar, ante essa solidão, É crise de palavras.
N
Neide Santos Neves
Caro amigo, excelente crônica que nos fala sobre o Cine Capitolio em Campina Grande, lá morei por 20 anos, sempre falavam que iriam demolí-lo. Não acredito na sua demolição e sim como dizes num aproveitamento das suas paredes para fins culturais. Abraços
M
Maria da Conceição Alves
Quando um intelectual e historiador da Igreja como Dr Eduardo Hoornaert elogia essa crônica como o fez, o que dizer? Aplausos e parabéns ao cronista. Maria da Conceição - Salvador BA
E
Eduardo Hoornaert
Damião, não estive muitas vezes em Campina Grande, mas tenho boas lembranças do Cine Capítólio, à direita do colégio das Damas (depende do ponto de vista). Foi frente ao Capitólio que Juscelino Kubitscheck falou em 1959 e eu assisti de uma das janelas do colégio das ditas Damas (belgas). Aí ele lançou a Sudene. Então o Capitólio é patrimônio sim. Parabéns por esse excelente texto. Eduardo.

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