Juiz que é juiz não persegue...
Porque perseguir ou proteger não é próprio de quem julga; a isenção é substancialmente o que define ser um homem juiz ou uma mulher, juíza. O juiz não pode ser amigo do réu, tampouco inimigo; ele, quando se mostra imparcial, logo, torna-se também réu. Seria como se fosse um jogo de “cartas marcadas”, entre o julgador e o julgado. Sendo assim, o juiz tendencioso terá sempre maior poder de “vencer”, da distribuição do baralho até o fim do jogo; quando sua função não tem a finalidade de perder, tampouco de vencer. Ao juiz cabe tão somente buscar a evidência contida ou demonstrada e comprovada nos autos; se essa evidência não for clara e convincente, ele não vê o objeto a ser apreciado pelo juízo; contudo não pode opinar, porque juiz não opina, julga; e para isso há de procurar prova ou provas contundentes. Infeliz do juiz que condena, quando a acusação é desprovida de prova, de fundamento. E é escandaloso quando ele sugere instruir os autos de modo a favorecer o julgamento que ele, subjetivamente, pretende fazer; ou quem o ajuda nessa empreitada assegura que dirá que uma denúncia inexistente foi anônima ou “apócrifa”. Nesse caso, como se verificar a veracidade da denúncia?
Pode um juiz ter amigo ou inimigo? Pode, mas, enquanto juiz, não deve; porque “seus amigos” ou “seus inimigos” não devem ser julgados por ele, o Juiz. Um dos momentos mais felizes do Código de Processo Civil trata da imparcialidade da Justiça nas mãos de quem julga. Nesse sentido, o princípio ético é radical: determina que o juiz entregue o caso a outro julgador que seja capaz de isenção. O impedimento se dá quando sua conduta pode ser interpretada estar motivada ou movida por razões ideológicas, partidárias, religiosas ou pior: por preconceito. Quando o juiz tem simpatia ou antipatia que desequilibre o ato de julgar, deve ele, eticamente e de sã consciência, declarar-se incompetente “ratione personae” para julgar, a fim de que se evite qualquer desconfiança de que ele tenha tido algum interesse em atender às pretensões de alguém, de outrem, ou, quem sabe, dele próprio... Jamais deve ele encomendar ao Promotor que se faça o Processo de modo que se facilite sua vontade atingir seus objetivos...
Há um ditado popular que revela a sabedoria do povo sobre esse assunto: “Nada se pode antecipar o que vai sair da barriga de mulher buchuda ou da cabeça de um juiz”. Em outras palavras, “cabeça de juiz é uma caixa de surpresa”. E ao exprimir o contrário, o que dá no mesmo, sobre o jogador de futebol que, pelo sapateado e pelo seu olhar, canta aonde vai chutar o pênalti: “Quanta ladainha, quanta embromação para tentar esconder o que todo o mundo já sabia” ... Enfim , dentro de um maracujá nunca espere encontrar caroços de feijão... Também não é crime você descobrir e espalhar, aos demais passageiros e à tripulação, o plano cochichado, privado, porém nefasto, entre dois passageiros que planejem a queda do avião, mesmo que eles sejam suicidas. Console-se quem é “bucho furado” ou boateiro, ainda se reconheça que nada deve ser mantido em segredo e considerado de “caráter privado” o que causará mal coletivo. Toda tal filosofia provém do bom senso que existe porque foi adquirido pela experiência popular; o bom senso ou o conhecimento vulgar é uma sabedoria que nos protege. Diz René Descartes, no seu Discurso do Método, e graças a Deus: “O bom senso é a coisa mais bem distribuída do mundo”. Finalmente, de tudo isso, conclui-se que devemos evitar o incêndio, mas, quando ele acontece, leva-nos positivamente a pensarmos sobre a prudência ou a solidariedade, dentre tantos benefícios que o fogo nos propicia; mas também sobre o perigo que nos pode causar o fogo...
Damião Ramos Cavalcanti
Enviado por Damião Ramos Cavalcanti em 13/06/2019
Alterado em 16/06/2019