Damião Ramos Cavalcanti

Enquanto poeta morrer, a poesia haverá de viver

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                                 Aonde me viro, Coronavírus

          Nenhuma peste do mundo fez se falar tanto sobre si como essa de agora, a tal do Coronavírus que, aqui e acolá, aparece com o nome de bula de remédio, numa sigla complicada, vinda do inglês: Covid-19. Para onde me viro, vejo, escuto, e escrevo também sobre essa coisa, que vem espantando o mundo, menos os idiotas. Ela é pequena, corrijo-me, ninguém a vê, mas, age como um gigantesco monstro, lembrando-me o filme Tarântula, que me fez medo nos tempos de menino: Uma enorme e sorrateira aranha que, saiu do seu esconderijo, para aterrorizar a cidade, com suas enormes patas e ferrões. Esse de agora é um vírus que se mata com apenas água e sabão, e, se você está distante disso, com álcool gel. Também não se propaga, caso o leitor se isole, afaste-se dos grupos maiores e deixe esse cultural chamego de beijar, cheirar, abraçar e de apertar as mãos dos outros; das crianças, sejam elas filhas ou netas. O beijo, nos dias de hoje, é pior do que o de Judas, porque não denuncia à morte, pior, mata. A situação é preocupante...
          Na nossa humanidade, há ruindades piores do que esse vírus. Uns que levam na brincadeira e ao descaso as fileiras dos insepultos que, acometidos desse mal, foram sufocados, sem poderem respirar e sem o direito de um leito na UTI; outros, notórios oportunistas, que espalham terrorismo e se aproveitam da desgraça alheia para se promoverem politicamente ou reivindicarem benefícios para si, tão somente para si, quando a necessidade e a doença têm alcance coletivo. Espremam-se algumas notas ou manifestações, de onde se estrai o “eu antes de tudo”. É isso aí de onde parte, nos dias de hoje, o grande mal da humanidade, fazendo até que se interprete ser o Coronavírus uma daquelas pestes ou dilúvios, que caíram dos céus como castigo divino. Primeiramente, nós temos tratado a natureza como lugar de se jogar lixo ou coisas descartáveis. À sua maneira, ela reage; sim, graças a Deus, ela reage; e lá vem o troco a uma moeda fétida e repugnante, que não queremos para nós mesmos. Mas, o pior dos males é um mundo que se movimenta, unicamente, para o endeusamento do dinheiro e do lucro, desconhecendo os valores humanos e éticos, e aprofundando um abismo que nos divide em poucos que possuem tudo, e em muitos que nada têm... Ter vantagem se tornou seus dez mandamentos. Observe-se no trânsito, na rua, nos fura-filas do Banco e até mesmo , agora, nos que, em supermercados já de prateleiras quase esvaziadas,  abocanham cem rolos de papel higiênico e muito mais frascos de álcool gel, deixando os outros sem nada.
          Aonde me viro, Coronavírus? Não! Medito outras coisas mais sérias e profundas. Algumas pessoas chegaram a se perguntar sobre os nossos valores, sobre os nossos princípios; ou a refletir: Tudo que está universalmente acontecendo seria o início da “destruição de um mundo” que deve ser corrigido? Contudo, acontecem exemplos de solidariedade. A força dessa crise, para não dizer dialeticamente o positivo desse mal, é fazer com que os idólatras do lucro e do dinheiro saiam das suas indústrias, diminuam as suas ganâncias, deixem seus escritórios e voltem para casa, a casa e a família que vêm sendo, há muito tempo, abandonadas. Destaco mães e pais que se obrigaram a substituírem a escola;  que sentaram no chão, em torno de um balaio de brinquedos para brincarem com suas crianças; que pediram aos seus filhos e filhas que desenhassem  músicas, como a Aquarela do Brasil; que parassem para responder ao filho, que, na sua simplicidade, interroga-lhe : - Mamãe , de que cor eu pinto o céu?          

 
Damião Ramos Cavalcanti
Enviado por Damião Ramos Cavalcanti em 20/03/2020
Alterado em 21/03/2020


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