Imaginar diferente do imaginário corrente
Tem se usado muito o binômio “racismo institucional”. Conjugação de duas palavras de peso. A primeira significa uma “tendência de pensamento” de quem não pensa; a segunda advém de instituição, o que significa organização social, administrativa, política, educacional ou religiosa, que nunca deveria institucionalizar qualquer tipo de preconceito... Embora de longa sobrevida, o racismo nunca deixou de ser execrável, motivando os mais horrendos crimes, como o de tentar exterminar uma raça, como foi a denominada “solução final”, durante o predomínio do abominável nazismo. Dentro de um sistema político ideológico como esse, a conduta dos seus agentes tinha, de modo subjacente ou ostensivo, a manifestação odiosa, o desprezo ao judeu, não lhes importava se fosse na rua dentro das suas próprias instituições, sob os vigilantes olhos de Hitler, da Gestapo e dos seus comparsas. Tal discriminação também era transmitida, da família nazista ao sistema de ensino. Havia famílias não nazistas? Havia; também professores e estudantes. Detesto a injusta generalização de que tudo era a mesma coisa, erro por logicamente não saber distinguir 100 de 10; ou todos, de alguns.
Muitos países, historicamente, passaram pela nefasta experiência da escravidão; todas elas motivadas e circunstanciadas pelo econômico, relevante fator dessa abjeção no mercado do trabalho. Um mal, trazido pelos colonizadores ao nosso país, através da cruel forma do tráfico, da venda de pessoas, crianças ou adultos, como se fossem gado, capturado nas suas terras. Forçosamente trazidos para cá, para trabalharem gratuitamente nas casas-grandes, nos campos e nas minas. Restou-nos, de todo esse funesto projeto, a imensa riqueza cultural que as negras e os negros trouxeram ao Brasil, criando e enfeitando todas as nossas artes, especialmente a nossa música, consideradas por nós e pelos estrangeiros como umas das mais belas e melhores do mundo.
Contudo, inevitavelmente, também por motivação econômica, as discriminações deixaram cicatrizes, sequelas, sentimentos de distinção, econômica e politicamente criação de uma “minoria”, o que vem muito paulatina e tardiamente sendo reparado. Dentre esses, o que vem a se constituir como “racismo institucional”. Seria o trato, de modo diferenciado, com essa minoria, às vezes inconsciente ou não, de maneira a não se propiciar, proporcionalmente em relação à população, o que seria justo e adequado para todos. Ter a consciência de que isso pode ocorrer é importante passo num longo caminho que deve ser livre de qualquer tipo de discriminação ou preconceito.
Enfim, se acontece o dito “racismo institucional”, não quer dizer que ele exista dentro de instituição x ou y, mas que paira, latente, proveniente dos nossos mais remotos períodos históricos. Reflita-se que, especialmente, define-se, noutro contexto, o sentimento preconceituoso individual, desse mais abstrato “racismo institucional”. Caso contrário, se o prezado leitor estiver numa instituição, praticaria um eventual “racismo institucional”? Acredito que não, sobretudo quando se discerne o individual do coletivo... O reducionismo e a generalização atingiriam até os que lutam e militam contra o racismo, seja ele ou ela lamentavelmente praticado por se incutir no pensamento coletivo, em que nitidamente há pessoas que até se formaram contrárias a qualquer modo de discriminação, desse famigerado e universalizado racismo. É natural que se fale de raças, até conseguirmos combater suspeita linguagem ofensiva, mas nunca para segregá-las. Somos todos, não importa a cor da pele, diferentes andarilhos de um mesmo caminho. Cabe-nos diversamente imaginar do imaginário corrente.
Damião Ramos Cavalcanti
Enviado por Damião Ramos Cavalcanti em 08/04/2021
Alterado em 08/04/2021