Damião Ramos Cavalcanti

Enquanto poeta morrer, a poesia haverá de viver

Textos


                                            Notícia que vira crônica    

          Dias atrás, neste Jornal, vi e li que João Azevêdo plantou mudas do Projeto Nascente Viva. Hoje, essas plantas estão maiores, cresceram em todos os sentidos. Era uma “boa nova” colorida, acho que tenha sido o gesto mais bonito do Governo; mais alto do que outras construções; mais comunicativo do que tantas estradas; e mais significativo do que inúmeros discursos. Que não se canse o Governador, no dia a dia de sua operosa gestão, de se ajoelhar na terra, como foi em Monteiro, ladeado pela Prefeita Ana Lorena, e cavar, cuidadosamente adubar as raízes para que essas plantas sejam árvores. Atitude simples, mas que se tornou solene. Ele, ao plantar, assumiu o compromisso de, no mínimo, “reflorestar 633 hectares de matas ciliares e nascentes (...)”. As coisas pequenas, às vezes quase invisíveis, ganham visibilidade e grandeza, dependendo dos olhos que as veem. Mesmo que o nosso planeta fosse coberto por um tapete verde-veludo, dar-nos-ia ele, sem árvores ou matas e florestas, uma visão sombria.
          O desmatamento, ambiciosamente, corta, com a motosserra ou com o “machado bronco”, as árvores mais altas e densas ou aquelas que tenham mais madeira, do seu tronco à sua copa. Os homens de negócio veem nos gigantes ipês, araucárias e baraúnas, formas diversas de serem transformadas em tábuas e dinheiro. Eles desprezam os troncos mirrados e tortos. A proteção tem sido esse desdém ao que não dá lucro. As árvores, em qualquer simetria, na melodia dos ventos, dançam com a sua beleza. Sentimos haver alegria. A mata desmatada é o vazio do belo, de novo, imagine-se um planeta sem matas e florestas. Nem um pio de pássaro, todos mudos, extintos, às vezes queimados pelos fortuitos e sobretudo propositados incêndios. Mesmo que os economistas sem alma nos digam que tais espaços podem ser campos para trigo ou “feijão que dá bom dinheiro”, nossos sentimentos devem se aconselhar com a natureza...
          Enquanto depender dos bons sentimentos, os campos serão campos; as matas, matas; as florestas, florestas. Elas são alma da vida ou o temor que, sendo destruídas, nós, aos poucos, desapareceremos. Nesse sentido, as plantações rentosas da monocultura não devem substituir as que nos rendem vida, ambiente e habitat. As mãos dadas com a riqueza, sem regras, leis e controle, são mãos e olhos dados a uma incurável tristeza. Hoje, qual o lugar que não necessite de árvores ou de plantação de suas mudas? Quando menino em Itabaiana, o Colégio Nossa Senhora da Conceição se uniu ao vizinho Grupo Escolar, para formarem, com macacões e utensílios, um Clube Agrícola que plantava frutas, verduras, nas escolas e outras maiores mudas pela cidade. Poderia haver uma ação de maior força pedagógica? Este fato repercute, ainda hoje, na minha madura consciência da preservação do meio ambiente.
          Plantar mudas de árvore é agir mais à frente de semear, fazendo a nossa parte de uma Harmonia Universal, universo onde uma misteriosa e sagrada sinfonia nos faz mais importantes e bem menor nosso eventual sofrimento. Prever um mundo sem tal natureza nos assusta como a previsão da morte. Contudo, plantar significa construir a tranquilidade de que as árvores crescerão, dar-nos-ão sombra, frutos, chuva, água e ar puro. Sobretudo, beleza. É um sublime sentir, expresso por Eça de Queirós, em A Cidade e as Serras, onde plantar uma árvore se compara a escrever um livro ou a fazer um filho...

 

Damião Ramos Cavalcanti
Enviado por Damião Ramos Cavalcanti em 16/03/2022
Alterado em 16/03/2022


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