A beleza da cidade é a Lagoa
Olho para a Lagoa e vejo João Pessoa, é ela a sua beleza, seu retrato emblemático, sua cara de cidade vista conforme o tempo e esse seu último aniversário. Cada um de nós tinha ou tem parte da sua vida em torno daquelas águas, entre as sombras do seu rarefeito arvoredo e, segundo sua visão, passa a contar seus acontecimentos com relativo telurismo. É verdade que a população se distanciou para o mar, mas a Lagoa não se afastou do seu povo. Está lá, imponente, com a guarda das palmáceas imperiais.
No Parque Sólon de Lucena, como as águas se misturam de várias chuvaradas, ali reunidas para beneficiar o saneamento urbano, as suas histórias se confundem e libertam-se de alguma cronologia. Uma porção de água que, ao mesmo tempo, é tempo e espaço. Contudo, escolhamos o período dos nostálgicos acontecimentos, que se desenrolaram sobretudo entre 1955 e 1970. Lá já estava entronizado, porém esquecido, o nosso bardo maior, Augusto dos Anjos, cuja bem maior estátua colocamos, durante a nossa gestão, como presidente, na Academia Paraibana de Letras. A Lagoa é o período da juventude poética, como Sérgio de Castro Pinto, antes palco das peladas de futebol, quando jogava até Geraldo Vandré.
Aquelas águas atraíam, mais do que hoje, as atenções, sendo a calçada do passeio ou o centro da cidade. Como se fosse uma rivalidade de namoradas da nossa rua, a Lagoa, aos poucos, foi tomando o lugar do Ponto de Cem Réis. Ela, o grande palco dos shows, bingos, comícios e da Festa da Mocidade, sob os cuidados da Casa do Estudante. Frequentada, como epicentro do flirt da estudantada do Lyceu Paraibano. O Ponto de Cem Réis continuava sendo o vaivém da cidade, tradição das discussões políticas, do fuxico do nosso convívio, onde a boataria e as intrigas efervesciam.
A juventude flertava mesmo era com e na Lagoa. Recinto preferido para exibirem a moda feminina; as conquistas dos novos namoros; rádios de pilha; óculos escuros; pentes inquebráveis para ajudarem a brilhantina Glostora, a manter em pé os topetes das frondosas cabeleiras; os cigarros com filtro e puxados à hortelã; camisas balon ou volta ao mundo; a sandália japonesa, ou “sapatos sem meia” de pano à Roberto Carlos; o carro Gordini ou Renault Dauphine; o Maverick; o Karmann Ghia; a zoada contada do motor de dois tempos do DKW Vemag; o Candango; o Volkswagen Sedan; o luxuoso Aero Wills e para os mais endinheirados “il bell’antonio” Simca Chambord. Não havia carro elétrico. Alguns “playboyavam” com Lambretta, exibida no luxuoso Cine Plaza pelos filmes italianos ou nas sessões de arte do Cine Municipal.
O Restaurante Universitário era o conhecido Cassino da Lagoa, sugerido por Argemiro de Figueiredo para encobrir as bombas da fonte. Também se chamava CEU, Centro Estudantil Universitário, levado pelo Regime de 1964 para isolar os estudantes na Mata do Buraquinho, no Campus Universitário... Reinava nos bancos da Lagoa o cineclubismo, reunindo a juventude sobre cinema, de onde saíram inveterados cinéfilos, críticos e até bons diretores de cinema.
Onde existe água, deve existir vida. Aqui, na nossa terra, pode existir mais vida nas águas da Lagoa: peixes, marrecos, sapos, pombos, rãs, garças, tartarugas, jacarés, gansos, cisnes e para completar o verde ornamento paisagístico de Burle Marx. Haja mais vida nas suas águas e assim na Lagoa, veremos mais natureza.